sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

O Porto Seguro (sobre meu pai)

(Para o meu pai, Reginaldo, com todo o carinho e a gratidão)

Ricardo Marques, 03/2004


Tal navio-caravela,
Nos remotos tempos de além-mar,
Quando ainda pouco se sabia,
Tu te lançaste, intrépido, a navegar.

Entre vagas e calmarias,
Ventos impiedosos a enfrentar,
De espírito aventureiro, livre,
Aos mistérios perseguiste, sempre a sonhar.

Na tua ousada trajetória,
Um mundo inteiro descobriste...
Maravilhas e gloriosas vitórias
Mantiveram tua bandeira em riste.

Enxergaste, porém, da vida um outro lado...
Ao descobrir como és inteligente e ágil,
As decepções, até dores e cansaço
Te revelaram que também és frágil.

Em mapas incompletos, com vigor e coragem,
Traçaste rotas desconhecidas, em ato de fé.
Heróico, lutando contra icebergs e miragens,
Construíste um sonho real, até hoje de pé.

Esposa e filhos que valem mais que o ouro,
Casa e vestes, com o pão sempre à mesa,
De todas as fortunas é este o maior tesouro,
Nome limpo e honesto, família íntegra e coesa.

Foi assim que, acertando e errando,
Construíste o maior império de todos;
Justo aquilo que a maioria, se empenhando,
Não consegue fazer, não passando de tolos.

Meu pai, tu sabes que não são poucos,
Os que desejam ser o que és e ter o que tens;
Não desejes, pois, ser o que são estes outros,
Nem apliques teu coração em outra forma de bens.

Hoje podes olhar para trás e ver, com glória,
Os grandes e difíceis mares por que navegaste,
Os erros e acertos, as batalhas e vitórias,
Assim como os muitos tesouros que ajuntaste.

Mas agora também é tempo, meu pai, meu orgulho,
De olhares pra frente com fé e atenção,
Sabendo que lá te espera um Porto Seguro,
Um Deus que te ama e que quer tua consideração.

Há tempos, mesmo quando tua vista não percebeu,
Ele olha por ti, Ele trabalha por ti...
Há séculos Ele até por ti morreu e venceu!
Ele quer acolhê-lo, agora, Ele o quer para Si.

As cãs são uma dádiva dos céus,
É o que dizem as Escrituras,
Mesmo nem todos sabendo disso,
É nesta fase da vida que a sabedoria mais perdura.

Quão sublime é, este tempo das cãs...
Por mais que muitos, iludidos, as escondam
Por se verem levando vidas vãs,
Deus atende, alegre, aqueles que O chamam.

Chama para ti o Senhor, ó pai amado.
Pede a Ele para teu coração visitar.
Verás que nada melhor pode ser desejado,
E quão maravilhoso é a Deus amar.

Então, sejam quais forem as tribulações desta vida,
Não importa que grandes ondas dominem o mar,
Em Porto Seguro estará sempre teu navio,
Com Jesus, pleno e vitorioso será teu caminhar.


* * *


Parabéns por mais este ano, papai. Meus joelhos estarão dia e noite dobrados, em oração, agradecendo por tua vida e por tudo que deste a mim, a meus irmãos e à nossa querida mãe. E pedindo a Deus que toque seu coração para que o milagre da fé quebrante teu espírito e o traga para os braços do Altíssimo.

Com intenso amor, do seu primogênito,


Ricardo
(04/03/2004)

Um momento no Natal...

Ricardo Marques

Naqueles dias saiu um decreto da parte de César Augusto, ordenando o recenseamento de todo o mundo habitado. Este primeiro recenseamento foi feito quando Quirino era governador da Síria. Todos iam alistar-se, cada um à sua própria cidade. Assim, subiu José da Galiléia, da cidade de Nazaré, onde morava, para a Judéia, à cidade de Davi, chamada Belém, porque era da casa e família de Davi, a fim de se alistar com Maria, sua mulher, que estava grávida. Estando eles ali, cumpriram-se os dias em que ela havia de dar à luz, e ela deu à luz a seu primeiro Filho, envolveu-O em panos, e O deitou numa manjedoura, porque não havia lugar para eles na hospedaria (Lucas 2:1-7). Por causa do censo, a família real tem de viajar por 126 quilômetros. José caminha, enquanto Maria, no seu nono mês de gravidez, segue em cima de um burro, sentindo cada solavanco, cada sulco, cada pedra da estrada.

Ao chegar, encontram a pequena vila de Belém repleta de viajantes. A hospedaria está lotada, havendo até quem se achasse um felizardo por conseguir negociar um espaço no chão. É tarde, todos dormem, não há acomodações. Mas, felizmente, o dono da hospedaria não é mesquinho. Explica que o estábulo está também lotado com os animais pertencentes aos hóspedes, mas que apesar das condições, haveria maior privacidade lá. José olha para Maria, que está tendo uma contração. "Ficaremos no estábulo", diz sem hesitar.

Era ainda noite quando José abriu a porta do estábulo, que rangeu caracteristicamente. Ao fazê-lo, os animais, assustados com o intruso, reclamam num coro discordante. O mau cheiro era penetrante e úmido, pois se as horas eram insuficientes para o estalajadeiro cuidar de seus hóspedes, que dirá dos animais. A luz tremeluzente de uma pequena lamparina, a eles emprestada pelo dono da hospedaria, projeta na parede estranha dança de sombras. Um lugar inquietante para uma mulher prestes a dar à luz. Longe de casa, longe da família. Longe de todas as suas expectativas para quando nascesse seu primeiro filho. Mas Maria não reclama de nada. Já é um alívio ter descido do lombo do burro. Encosta-se à parede, sentindo os pés inchados, as costas doerem, e as contrações cada vez mais fortes e mais freqüentes. José corre os olhos pelo estábulo. Não há tempo a perder. Rápido. Uma manjedoura servirá como berço. O feno serviria de travesseiro. Cobertores? Cobertores? Ah, sua manta estaria ótima. Aqueles trapos dependurados ajudariam a enxugar o nenê.

Maria se contorce numa contração mais forte e pede a José que providencie um balde de água. O nascimento não seria nada fácil, nem para a mãe nem para a criança. Todos os privilégios reais se encerravam ali, numa concepção humana e natural – não era para ser diferente do normal. Um grito de dor vindo de Maria interrompe a calma daquela noite silenciosa. José está voltando, apressado, com a água transbordando do balde de madeira. O alto da cabeça já se introduz neste mundo. Gotas de suor caem pelo rosto contorcido de dor de Maria, enquanto José, a parteira mais atípica de toda a Judéia, se posta ao lado. As contrações involuntárias não são suficientes, e Maria tem de ajudar com todas as forças, quase como se Deus estivesse se recusando a vir ao mundo sem a ajuda dela. José coloca uma manta sobre Maria que, com um último esforço e longo suspiro, termina seu trabalho de parto.

Nasceu o Messias. Tem a cabeça alongada pelo caminho estreito que atravessou ao nascer. A pele ainda é clara, pois levará dias até que a pigmentação normal ocorra. Há muco nas orelhas e narinas. O líquido amniótico o envolve, deixando-o úmido e escorregadio. O Filho do Deus Supremo está preso pelo cordão umbilical a uma garota judia. O bebê está sufocado e tosse. José, instintivamente, vira-o de cabeça para baixo para que se desobstrua a garganta. Então o nenê chora.

Maria oferece o seio ao trêmulo bebê. Acomoda-o em seu peito e aquele choro tão aflito aquieta-se. A cabecinha delicada encosta-se em terreno ainda desconhecido. Será sua primeira lição. Maria pode sentir as batidas rápidas do coraçãozinho, enquanto o bebê tateia à procura do seio para mamar. O seio de uma jovenzinha alimentando o Criador. Pode algo ser mais enigmático – ou mais profundo?

José senta-se exausto, silencioso e maravilhado. O bebê termina de mamar, suspira, a Palavra divina reduzida a alguns sons ininteligíveis. Então, pela primeira vez, os olhos se fixam nos de sua mãe. A única e verdadeira Divindade, que transcende o Universo, esforçando-se para focalizar o rosto de quem lhe abrigou no ventre. A Luz do Mundo, ali, se aninhando. Os olhos de Maria enchem-se de lágrimas. Toca as delicadas mãozinhas. E mãos que um dia esculpiram o mundo enroscam-se nos dedos dela. Ela olha para José e, através de lágrimas comovidas, suas almas se encontram. José aproxima-se mais de sua amada. Cabeças juntas, admiram o pequeno Jesus, cujos olhinhos pesados começam a fechar-se. Foi um longo dia. O Rei está cansado.

Dessa maneira, sem nenhum alarde especial, Deus entrou para o lago morno da humanidade. Sem nenhuma pompa ou cerimônia. É fato que anjos se prostravam em volta, contemplando a realização do maior de todos os mistérios, a eles prenunciado desde a origem dos tempos, quando o homem afastou-se do Criador. Agora, “parte” do próprio Criador assumia forma humana. Entretanto, no lugar em que se poderiam esperar exércitos saudando o Verbo que se fez gente, havia apenas moscas. Onde seriam esperados chefes de estado, havia apenas burros, algumas vacas agitadas, um aglomerado nervoso de carneiros, um camelo preso a uma corda, e um rato de celeiro que olhava curioso e furtivo. Tudo conforme havia sido previsto e escrito, séculos e séculos antes...

Maria contava apenas com José para consolar-se de suas dores e para repartir suas alegrias. Havia, como se sabe, um coro de anjos anunciando a chegada do Salvador – mas somente para um grupo pequeno de pastores de ovelhas. É verdade também que uma estrela magnífica brilhou no céu para assinalar o lugar do nascimento dEle, mas apenas alguns sábios estrangeiros a entendiam e, vendo-a, a seguiram. Assim, na pequena vila de Belém... Numa noite silenciosa... O nascimento real do Filho de Deus aconteceu tão tranqüilamente... Enquanto o mundo todo dormia e sequer imaginava o que estava acontecendo...

Amado Jesus, embora não houvesse lugar para Ti na hospedaria, permite que hoje eu tenha no coração um lugar amplo para oferecer-Te. Apesar de não teres sido bem recebido por muitos do Teu próprio povo, permite que nesta hora eu possa receber-Te de braços abertos. Embora Belém tenha negligenciado a Ti no censo, concede-me, neste momento, a graça de estar por perto e saber que Tu és Deus, conforme o disseste de Tua própria boca. Sim, Tu és Deus... Tu, cujo único palácio era um estábulo e único trono um coxo de cavalos, cujas únicas vestes eram trapos.

De joelhos, meu Senhor, quero confessar que, como homem pecador, estou condicionado à pompa, à vaidade, ao orgulho, ao preconceito e à ostentação, coisas que nos obscurecem na aceitação de um Deus que balbucia numa manjedoura. Perdoa-me, por favor. Ajuda-me a compreender pelo menos algumas das lições que o Teu nascimento, que comemoramos hoje, tem para ensinar – que o poder de Deus não está condicionado à força, mas à fraqueza; que a verdadeira grandeza não se alcança com posses, vaidade e egoísmo, mas com resignação, com o negar-se a si mesmo, com o amor ao próximo, percebendo-se o mundo e seu sistema com outros olhos, os olhos do espírito. E ainda nos ensinas que a mais secular das coisas pode ser considerada sagrada quando Tu estás ali presente. E, quando Tu, cheio de infinito amor, ansioso pela minha Redenção eterna, parares à porta de minha casa e bater, conceda-me uma sensibilidade especial para o som daquela batida, e assim apresse-me em atendê-la. Não permita que eu te deixe esperar no frio, ou que ainda te mande para algum estábulo. Possa meu coração ser quente e acolhedor, de tal forma que, quando Tu bateres, haja sempre à tua espera um lugar digno de Ti...

domingo, 19 de outubro de 2008

Ariza, a mulher de “SEMPRE”...

SEMPRE Linda!

Esposa SEMPRE Incrível!

Mãe SEMPRE Inigualável!

Avó SEMPRE Presente!

SEMPRE dedicada à Família!

Irmã SEMPRE Companheira!

Filha SEMPRE Exemplar!

Mãe... Nós te amamos!


Ricardo Marques (19/10/2008)
(Reconhecimento à "sempre" Ariza, no Dia das Mães)

domingo, 10 de agosto de 2008

Meu pai

(Música para meu pai, no Dia dos Pais)

Ricardo Marques (10/08/2008)

Sabes, pai
Estava aqui a pensar...
O que eu fiz para te merecer?
Nada, eu sei.
Tu és bênção de Deus
Que Ele nos dá por amor
E não por merecer

Amor de pai, amor de mãe
Como entender? Eu não sabia...
Até que pai me tornei
E agora sei: ser pai, ser mãe
É a perfeição do vencer

Antes eu pensava:
Como retribuir?
Aí descobri: não posso.
Amor não se retribui,
Amar é dar sem querer receber
Amor de pai, amor de mãe
Imita o amor de Deus

Cresci te vendo assim
Melhor do que o Batman
Maior do que o incrível Hulk
Tu és meu super-herói
Um cara legal, meu pai, meu tudo
Um amor sem igual

Meu velho amigo
Eu queria falar
Tu és mais que amigo
Em quem posso confiar
Meu pai amigo
Eu te amo demais
Hoje e sempre,
Não só no dia dos pais

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Maior louvor (à minha amada esposa - IV)

Acordei hoje cedo de coração apertado,
Olhos marejados, vontade enorme de te dizer
Ah, querida, como admiro a mãe que é você...

Fecho os olhos e vejo momentos de outrora
Minha garota-sorriso, tão decidida, tão madura
Maravilhosa mulher, foste para mim uma cura

Nossos filhos, sonhos e desafios realizados
Sem hesitar, as costas deste à vaidade,
Quanto renunciaste, amada minha, preferindo a maternidade

Minha gratidão a ti, como expressar?
O modo como te entregaste na batalha pelos teus
Bem-aventurada, mulher sábia, mãe-presente vinda de Deus

Espírito humilde, força, ternura e bondade que,
Num só corpo devotado, gerou e amamentou
Tantos dias, tantas noites, tantas lições que ensinou

Heroína de nós todos, sempre animada, âncora firmada
Colo querido, mãos caridosas, incondicional amor
Ana Carmem, és, dentre todas as mães, a que merece maior louvor.

Poema para Ana Carmem – Dia das Mães (11/05/2008)

domingo, 9 de março de 2008

Um encontro inesquecível

Ricardo Marques*

Os hebreus sofriam há 400 anos, escravos dos egípcios. Deus preparara o caminho de um escolhido, desde o berço, para libertar Seu povo do cativeiro para a Terra Prometida. Moisés, criado como filho do próprio faraó, foi levado a fugir do Egito. Passou anos no deserto, pastoreando ovelhas e aprendendo com os desafios da vida, até que Deus o chamou para essa árdua missão.

O faraó não quis deixar o povo partir, daí seguiram-se pragas sobre o Egito. Somente a última delas foi terrível o suficiente para que o faraó se desse por vencido e libertasse os hebreus. Na Bíblia, em Êxodo, cap. 12, Deus avisa que todos os primogênitos seriam mortos por um "anjo da morte" que passaria pelo Egito; entretanto, os filhos dos hebreus seriam poupados. Para isso, deveriam imolar um cordeiro sem defeito, e aspergir o sangue nas portas de suas casas. O cordeiro seria assado e comido por cada família e, quando viesse o "anjo da morte" a cada casa, vendo o sangue na porta, passaria por cima. Vem daí o termo páscoa, do hebraico "pessach", que significa "passagem".

Conforme dito, aconteceu. E, após isso, o povo foi liberto. Em Êxodo (12:13, 14), Deus institui a celebração desse evento: "(...) Quando eu vir o sangue do cordeiro, passarei por vós, e não haverá entre ti praga destruidora, quando eu ferir a terra do Egito. Este dia vos será por memorial, e o celebrareis como solenidade ao Senhor: nas vossas gerações o celebrareis como estatuto perpétuo".

Séculos se passaram. Jesus, o Messias prometido, Deus vindo em forma humana conforme prometido por todo o Antigo Testamento, é exaltado por João Batista: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo" (João 1:29). Os discípulos começavam a entender: todo o evento da Páscoa, o cordeiro imolado, o sangue derramado que vencia a morte, na verdade foram dados por Deus como símbolos da obra redentora de Cristo, a vida eterna presenteada àqueles que crêem e aceitam o sacrifício do Cordeiro de Deus por cada um de nós. Jesus, o único que jamais pecou. Por isso o cordeiro pascal tinha de ser sem defeito.

É chegado o dia. Jesus sabia, e já avisara: seria morto como o cordeiro da páscoa. Na celebração da festa com seus discípulos, durante a ceia, pede que, dali em diante, ao celebrarem a Páscoa, pensem no pão simbolizando o corpo de Cristo, e no vinho como o sangue dEle. E pediu que aquilo fosse repetido toda Páscoa, em memória dEle, até que voltasse.

Jesus foi preso. Açoitado, espancado ferozmente. Dali, trôpego e exausto, caminhava pela via dolorosa, carregando nas costas duas enormes cargas: uma pesada cruz de madeira, onde dentro em pouco seria cravado pelos punhos e tornozelos; a outra, o pecado de toda a humanidade, por quem, em infinito ato de amor, morreria para que vivêssemos.

Um homem simples, vindo do campo, Simão chegava a Jerusalém para participar do sacrifício anual da Páscoa. Provavelmente trazia, na bagagem, um cordeirinho a ser imolado. Mas, no coração, talvez a desesperança de um futuro incerto, numa terra oprimida, um povo sofrido.

Passava por ali, vendo a multidão, ouvindo a confusão nas ruas. De repente, seu olhar se cruza com olhos que ele jamais vira antes. À margem da dor e da zombaria, Jesus mira firme a vista de Simão: em menos de um segundo, a percepção da eternidade, alma invadida pelo amor perfeito, infinito.

Um tropeço, o olhar gracioso se desvia, a cruz vai ao chão. Simão sequer teve tempo de atentar para o sangue a cobrir a face daquele homem; sequer se dera conta de toda a dimensão cósmica do que ali acontecia... Repentina, a ordem dos guardas: "Ajuda-o! Carrega-lhe a cruz!".

Um homem comum, que apenas passava. Um envolvimento inesperado, um privilégio a ser compreendido: em suas costas, o peso do símbolo dAquele que venceria a morte. Uma páscoa diferente... Um encontro inesquecível.

(*) Ricardo Marques é biólogo e paleontólogo, neurocientista e educador, membro da Igreja Batista Central e diretor-geral do Colégio Kerigma.

Artigo publicado no Jornal O POVO, em 09/03/2008

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Lá, não sei onde... Quando chegar o tempo.

Recentemente li uma mensagem de uma amiga, numa Lista de Discussão, falando de uma cidade do interior, onde as pessoas são "calmas e felizes". E aquelas palavras me remeteram, num relance, a memórias que eu pensava esquecidas.

Ah! Um dia me mudo para uma cidadezinha dessas...

Me lembro de minha infância e adolescência, quando ia muito ao interior do Ceará, passando férias em casas de meus tios-avós maternos.

Nas palavras de Paulo César, cantor e compositor do Grupo Logos: "Acordar bem cedo e ver o dia a nascer... E o mato molhado anunciando todo o cuidado de Deus".

Ah, aquele cheirinho de estábulo e passarinhos de todos os tipos cantarolando ao redor da casa – não tem que dinheiro que pague. Tomar leite com pão quentinho, queijo coalho assado e ovo frito, para depois sair andando, sem pressa nem hora, pelas veredas abertas na matinha, árvores frondosas por todo lado a nos sombrear, até chegar nas casas do pessoal simples e hospitaleiro, onde nos aguardava um tacho de queijo ainda sendo feito, ou a delícia de um “alfinim” bem puxado, como chamávamos por lá. A hora do lanche era regada a mel de engenho com farinha, iguaria que nenhum restaurante chique da cidade grande consegue entender...

Amava tomar banho de rio, bóia feita de cabaças... Ou então daquelas menos naturais, porém não menos divertidas, de câmaras de ar de pneu de trator. Quem viveu isso? Cabia umas três crianças numa só! Na beira do rio disputávamos espaço com galinhas d´água, jaçanãs e outros bichinhos que fuçavam por ali, catando comida.

O almoço, aquele feijão bem temperado, macaxeira cozida com manteiga, carne de sol desfiada... Hummmm, e a sobremesa era aguardada com ansiedade, aquele doce de leite ou de goiaba, ainda meio quentinho, acabado de fazer ali mesmo. Mais tarde, hora de pescar.

À noite era uma graça, sentávamos no meio da rua para contar e ouvir histórias de fantasmas, de cemitério, de lobisomem, saci e caipora. Ainda cedo todo mundo entrava, à luz de lampião e lamparina, e se não fechássemos logo as portas os “sapos-cururu” entravam na casa aos montes e a gente tinha que enxotá-los. Tudo era uma diversão.

Falando em pescar, tive a impagável chance de morar um ano no interior do Mato Grosso, ainda pré-adolescente, tempo em que esperava ansiosamente o sábado de manhãzinha para sair, debaixo de um frio congelante, e pescar lambari com varinha de bambu. Mais tarde voltávamos com um cesto cheio, para assar tudo com farinha e ficar comendo debaixo de uma árvore, defronte o rio, ao som de corredeiras e cachoeiras, contemplando a paisagem, conversando ou lendo revistas do Capitão Marvel, do Fantasma, dos Sobrinhos do Capitão.

Mas eu nasci mesmo foi no Piauí, na maravilhosa Parnaíba, cidadezinha pacata e gostosa de se viver. Ruas à sombra de grandes árvores, pés de oiti, jambo e mangueiras centenárias, frondosas. Na casa de meus avós paternos, gente humilde dotada de maravilhosos talentos artísticos, um quintal de uns 12 metros de fundo, cheio de árvores frutíferas e com direito a lagoinha para os marrecos. Encher baldes e baldes puxando água em bomba manual era diversão, e não trabalho.

Muitas vezes passei roupa com ferro de brasa, e ajudei minha avó a acender o fogão a lenha. A TV era ainda em preto e branco, começava às quatro da tarde, se jantava ás 18 horas, mas às nove da noite todo mundo se recolhia, a luz era cortada e entrávamos debaixo de mosquiteiros, pois as muriçocas se atiçavam e não tinha quem agüentasse. Mas tudo era levado na esportiva, na naturalidade. Até chegar o sono, o tic-tac do pêndulo do carrilhão, lá na sala, marcava a cadência que governava aquela vida despretensiosa e tranqüila.

Êta, saudade, meu. Hoje meus filhos nem imaginam o que é isso. Mas não é só culpa da cidade grande, não. O próprio interior mudou muito... Mas sei que, em algum lugar, ainda existe a vida bucólica a que me referi. E é lá, não sei onde, que quero terminar meus dias, quando chegar o tempo. Esse é um de meus pedidos a meu bom Deus...

Ricardo Marques.

(28/11/2007)

Cálcio, vitamina D e magnésio: segredos biológicos

O consumo de cálcio, sua biodisponibilidade e sua carência na sociedade atual, avaliados em conjunto com as necessidades de vitamina D e magnésio

Ricardo B. Marques
Biólogo. Professor de Biologia Celular e Molecular. Membro da American Society for Biochemistry and Molecular Biology (ASBMB, USA) e da Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento (SBNeC).


Deficiências nutricionais na sociedade moderna

A importância dos sais minerais para o organismo é conhecida há bastante tempo. As informações a respeito eram, a princípio, obviamente limitadas, baseadas quase unicamente na observação empírica, numa curiosa mistura de fatos científicos com crendices populares. Hoje, entretanto, após séculos de testes, experiências e pesquisas, e embora ainda haja muito a se estudar e compreender, não resta dúvida de que já dispomos de um conhecimento razoavelmente consolidado a respeito da função de cada elemento químico para as células e para o corpo.

Em contrapartida, tal conhecimento parece, ainda, carecer de uma adequada aplicação, tanto por parte da população leiga, quanto pela maioria dos profissionais da área de saúde – inclusive a comunidade médica, a tal ponto de não serem poucos os equívocos de diagnóstico e/ou de condutas terapêuticas para com pacientes que poderiam se prevenir ou pelo menos controlar diversas enfermidades através da correção nutricional, especialmente com o uso responsável de suplementos de alta tecnologia e qualidade. Foi essa constatação que surpreendeu o Dr. Ray Strand, médico e escritor norte-americano conhecido por sua atual – e consistente – postura em favor de terapias com suplementos nutricionais de alta tecnologia para prevenção e controle de diversas doenças, e pelos casos impressionantes de sucesso que tem obtido com seus pacientes, isso após haver combatido por quase 30 anos o uso de suplementos. Em seu livro (1), o Dr. Strand faz um mea culpa e explica como e por que a maioria dos médicos ainda não compreende, e por isso mesmo não aplica os fundamentos da nutrição celular e molecular, comentando as perdas que isso acarreta. Tal fato remete à seguinte percepção: se no meio médico a desinformação sobre essa área persiste tanto, é compreensível que em outros círculos se ignore ainda mais o papel preponderante dos nutrientes na saúde – fato que vem mudando, é verdade; contudo, lentamente.

Dentre a diversidade de nutrientes objetos desse desconhecimento está, por exemplo, o cálcio. Evidência disso é o fato das pesquisas revelarem carência desse importante elemento em parte considerável da população. Simões et al (2) comentam que, no Brasil, investigações relativas à ingestão de cálcio por crianças e adolescentes de diferentes regiões indicam resultados nada otimistas, pois os resultados demonstraram que não foram alcançadas as recomendações para ingestão desse importante mineral.

O problema, porém, não se restringe à deficiência do cálcio na dieta, uma vez que se deve admitir que em alguns estratos da população de algumas regiões há pessoas consumindo alimentos ricos nesse elemento. A questão parece mais complexa e inclui modificações fisiológicas no organismo e condições metabólicas que interferem na biodisponibilidade (capacidade do organismo de aproveitar bem o nutriente); tais modificações e condições, influenciadas por fatores diretos e indiretos, causam perda de cálcio, de maneira que não são raros indivíduos consumindo doses adequadas de cálcio e, mesmo assim, apresentarem carência do mesmo. Ronsein et al (3) demonstram que o estresse é um desses fatores capazes de modificar o metabolismo de vários nutrientes, como vitaminas do complexo B, cálcio, magnésio, ferro, zinco, entre outros; segundo os autores, quando estamos estressados, além de se alterar a nossa fisiologia, ainda tendemos a negligenciar nossa dieta e, então, piorar essa condição patológica pela ingestão inadequada de minerais. Já ficou estabelecido que deficiências desses minerais estão ligadas a uma grande variedade de disfunções, que vão desde a infertilidade e redução do crescimento, até a úlcera, hipertensão arterial e doença isquêmica do coração. Funções de tamanha importância deveriam remeter a população e os profissionais da área de saúde a buscarem maior informação e formação em nutrição celular e molecular, mas o que acontece é o contrário: são muitas as lacunas. Caso típico de desinformação é assistirmos pessoas ingerindo nutrientes em combinação com outros que podem afetar sua biodisponibilidade – nesse caso, por exemplo, é possível alguém tornar-se anêmico mesmo consumindo ferro em quantidade, ou ter problemas de carência de cálcio mesmo tendo boas fontes do mesmo em sua dieta.

Osteoporose

A osteoporose é uma doença grave, debilitante, caracterizada pela desmineralização dos ossos a ponto de deixá-los excessivamente frágeis e facilmente sensíveis a fraturas. Muito se fala sobre osteoporose, mas poucos sabem que geralmente ela não é causada pela deficiência de cálcio na dieta, e sim por uma perda excessiva desse mineral. Lee & Hopkins (4) informam que se pode ingerir todo o cálcio que se queira, mas que, se a sua dieta e o seu estilo de vida não forem saudáveis, ou se você estiver tomando remédios que causem perda de cálcio, seus ossos ainda estarão perdendo mais desse mineral do que o teor que estiver sendo consumido nas refeições.

O próprio uso de suplementos costuma ser equivocado, não só pelo fato de a maioria ser sintética e de baixa biodisponibilidade, ou por serem consumidos em dosagens inadequadas, ou por serem contaminados por toxinas (caso do cálcio de ostras, comumente contaminados por toxinas diversas), ou por não disporem das combinações ideais dos componentes, mas também porque se ignora a influência de outros fatores, dentre eles a ingestão de alimentos prejudiciais. Lee & Hopkins (4) fazem referência, por exemplo, ao estrago que o açúcar faz no corpo de um adolescente em desenvolvimento, ou mesmo no organismo de um adulto, na opinião deles chegando a superar, em muito, qualquer benefício que possa advir de uma suplementação de cálcio. Daí deduz-se que a boa saúde nutricional se obtém mediante um programa integrado de alimentação e suplementação previamente planejado, e não simplesmente pela decisão de se ingerir, isoladamente, um elemento que se acredite estar em falta no organismo. Seria o caso de se perguntar: de que adianta alguém com osteoporose se suplementar de cálcio enquanto se permite agredir o organismo com altas doses de açúcares?

Por outro lado, os hábitos alimentares da atual sociedade representam um fator complicador na busca de uma boa nutrição. Isso pode ser bem ilustrado no caso do cálcio, em que a maioria das pessoas, assim como dos profissionais de saúde, vê no consumo de leite e seus derivados a solução definitiva para prevenir e/ou remediar a desmineralização óssea. Entretanto, Lee & Hopkins (4) alertam, por exemplo, para que não se dependa somente do leite para obter o cálcio pretendido, pois o leite tem uma baixa relação cálcio/magnésio, e o organismo necessita de certa quantidade de magnésio para que o cálcio possa se fixar nos ossos. Curiosamente, verifica-se que boa parte dos médicos não inclui o magnésio nos suplementos de cálcio que receitam para seus pacientes de osteopenia e osteoporose. Além disso, há de se considerar os inconvenientes típicos do consumo de leite de animais, como o fato do teor nutricional não ser o adequado para um ser humano, bem como pelos transtornos alérgicos e/ou digestórios que o leite de animais causa aos humanos jovens e adultos, já que, como todos os demais mamíferos da Terra, fomos biologicamente feitos para digerir certos componentes do leite apenas na infância e, principalmente, na fase da amamentação. Considere-se, ainda, o fato de que o leite para o qual fomos feitos para consumir é o materno, e não o de vaca ou de outro animal.

Ainda para Lee & Hopkins (4), a ingestão adequada de cálcio é, sim, um fator importante na prevenção da osteoporose, porém alertam para alguns “ladrões” desse elemento, a exemplo dos refrigerantes, ricos em fosfato, que os autores classificam como “um dos principais contribuintes para a osteoporose”, uma vez que pesquisas têm mostrado uma relação direta entre excesso de fósforo e perda de cálcio. O mesmo acontece com o consumo excessivo de carnes, também ricas em fósforo, e tratamentos em longo prazo com cortisonas sintéticas. Nesse último caso, as moléculas de glicocorticóides se parecem muito com as de progesterona, de maneira que ambas parecem competir pelos mesmos receptores nas células formadoras de ossos; o problema é que a progesterona transmite a mensagem para que os ossos cresçam, enquanto os corticóides enviam a mensagem para que parem de crescer – por isso seria mais recomendável que os médicos receitassem hidrocortisona, que é natural e de baixa dosagem, do que cortisonas sintéticas. Outro aspecto fundamental na prevenção e/ou controle da perda óssea são os exercícios físicos, uma vez que há uma relação intrínseca entre o sedentarismo e a osteoporose.

Para Silva et al (5) a puberdade se destaca como um período crucial para a aquisição do conteúdo mineral ósseo. Embora não haja consenso sobre a idade em que o pico de massa óssea ocorre, vários autores consideram a infância e a adolescência como os períodos de maior aumento na massa óssea, para ambos os sexos, já havendo sido descrito que, durante as transformações dos eventos da puberdade, os adolescentes acumulam 40% de sua massa óssea total. Estes autores defendem uma intervenção nutricional precoce com o objetivo de prevenir o aparecimento de quadros de osteoporose, pois, embora essa doença se manifeste nos idosos, a predisposição para ela tem início na infância e na adolescência. O tecido ósseo, como outros, apresenta um processo de maturação que se estende das primeiras semanas de vida embrionária até a idade adulta, e pesquisadores defendem que a mineralização óssea começa na vida fetal e continua durante a infância e a adolescência, quando então se estabiliza, entre 21 e 25 anos de idade. Já o crescimento ósseo se caracteriza por uma remodelação constante, através de ganho e perda de massa óssea, sendo a mineralização óssea um processo cíclico de produção e reabsorção, cujo equilíbrio se modifica ao longo da vida.

Na fase da infância e adolescência, a formação óssea predomina sobre a reabsorção; na idade adulta, ambos os processos se estabilizam; a partir dos 45 a 50 anos, principalmente nas mulheres, quem predomina é a reabsorção. Percebe-se, portanto, que a relação entre cálcio e ossos não é estática, mas dinâmica, de forma que os ossos não são simples acúmulo do mineral, mas tecidos vivos que recebem e liberam cálcio constantemente. Se o processo de retenção/fixação e de reabsorção/retirada for desregulado por algum fator, ocorre perda de massa óssea, podendo resultar em osteoporose. É por isso que Silva et al (5) ressaltam que o risco de osteoporose pode ser reduzido se houver uma preocupação em aumentar a massa óssea durante a infância e a adolescência, cuidando-se, posteriormente, da taxa de perda óssea pós-puberdade, com especial atenção aos fatores que afetam negativamente a densidade mineral óssea durante a fase de crescimento. Os referidos autores chamam a atenção para o fato de que a adolescência é uma fase marcada por mudanças nas preferências alimentares e por diversos questionamentos, influências, pressões e modificações, que fazem deste um período de risco nutricional, devendo este aspecto suscitar maiores cuidados e atenção por parte da família e demais círculos de influência.


Cálcio

O cálcio é um dos minerais mais importantes e de maior demanda no organismo. Embora popularmente se imagine que a função dele seja apenas compor a estrutura óssea e dos dentes, a verdade é que está envolvido numa série de funções de alta relevância, a exemplo da contração muscular, do impulso nervoso e da coagulação sangüínea, entre várias outras. Em 2003 um grupo de pesquisadores (6) da UFMG (Brasil) e da Universidade de Yale (EUA) descobriu uma estrutura no interior do núcleo das células que armazena cálcio. Embora ainda haja muitos esclarecimentos a serem feitos após essa descoberta, as notícias ressaltam a grande importância desse mineral. Melo (7) cita a pesquisadora da UFMG, Maria de Fátima Leite: “O aumento da concentração de cálcio em cada área define uma função diferente a ser executada pela célula”, e explica que “o cálcio modula funções como proliferação e diferenciação celulares, ativação e transcrição de genes, apoptose (morte programada das células), síntese de proteínas, secreção hormonal e contração muscular” – acredita-se que esse elemento deve regular prioritariamente a expressão de alguns genes e até influenciar a própria estrutura do DNA. Por sua vez, Azevedo (8) informa: “O cálcio é um gatilho biológico. Uma vez acionado na hora e na quantidade certas, ele ativa determinadas partes do DNA. O cálcio regula os batimentos do coração, o movimento de braços e pernas, o piscar dos olhos, enfim, cada movimento de nossos músculos. E faz mais: também está ligado, por exemplo, à liberação dos hormônios, como a insulina, e ao próprio ritmo de vida e morte das células”.

A hipocalcemia (deficiência de cálcio) é caracterizada por um conjunto variável de sintomas, descritos com propriedade por Arioli & Correa (9). De acordo com esses autores, a manifestação clínica da hipocalcemia aguda é a crise de tetania (excitabilidade neuromuscular exacerbada), em geral precedida de formigamento e adormecimento no entorno da boca e das extremidades do corpo, e de contrações dolorosas de músculos isolados ou de grupos musculares. A crise pode ser acompanhada de sudorese (suor excessivo), cólicas abdominais, vômitos e broncoespasmo, provavelmente por causa da disfunção do sistema nervoso autônomo. Já nas crianças, o espasmo da laringe pode ser a única manifestação de tetania. Pode haver convulsões em pessoas predispostas.

Edema (inchaço) de papila tem sido descrito na hipocalcemia e, quando acompanhado de quadro convulsivo, pode fazer o médico confundir com tumor cerebral.

Têm sido descritos vários distúrbios mentais em quadros de hipocalcemia, como depressão mental, irritabilidade, nervosismo e ansiedade. A pele pode ficar seca, acompanhada de queda de cabelo e unhas quebradiças. As alterações dos dentes ou defeitos no esmalte podem orientar a época de aparecimento da hipocalcemia, embora não raro alguns médicos se equivoquem no diagnóstico por desconhecerem essa dimensão fisiológica, bioquímica e molecular, de um quadro de carência de cálcio.

Em 50% dos casos de pacientes não tratados pode haver formação de catarata, tanto precocemente quanto após vários anos. Não é incomum que a densidade óssea se mostre normal, e às vezes até um pouco aumentada. Em certos casos surge comprometimento cardíaco. Na gravidez, na lactação e no período menstrual pode-se ter um agravamento desses sintomas, e as manifestações de tetania nem sempre são muito evidentes.

O consumo de cálcio deve ser feito observando-se a maneira como ele interage com outras substâncias, pois algumas encontradas em certos alimentos reduzem a absorção do mesmo. É o caso, por exemplo, dos fitatos, encontrados na película externa dos grãos de cereais, e dos oxalatos, presentes na beterraba, acelga, espinafre etc. O estresse também aumenta a excreção de cálcio e incrementa sua perda. Vários medicamentos afetam a biodisponibilidade de cálcio no organismo, como os corticóides sintéticos citados anteriormente, e certos tipos de antiácidos. O uso excessivo de refrigerantes, em particular os do tipo “cola”, é considerado um problema bastante sério, pois o excesso de fosfato prejudica o metabolismo do cálcio – estudos realizados com adolescentes comprovaram que refrigerante representa um agente de risco relevante para a ocorrência de osteoporose no futuro.

Assim como os refrigerantes, a comida industrializada é rica em fósforo, que é usado como acidulante na conservação dos alimentos. Quando chega ao intestino, o fósforo tenta entrar nas células usando o mesmo sistema de entrada do cálcio, daí impede que o cálcio passe e chegue ao sangue. Sabemos que o fósforo é um elemento também importante para o organismo, contudo nosso corpo não imaginava que inventaríamos alimentos e bebidas que nos forneceriam sobrecarga diária desse mineral, desregulando sua relação com o cálcio.

Por sua vez, Simões et al (2) alertam: uma dieta rica em fibras prejudica a absorção intestinal de cálcio, principalmente nos idosos, razão pela qual pessoas adeptas de tais dietas devem ingerir cálcio nos intervalos entre as refeições; não se deve, no entanto, por temer a má absorção do cálcio, pensar em se privar de alto teor de fibras na dieta, pois as mesmas são indispensáveis à saúde intestinal e geral do corpo, sendo, inclusive, um dos principais fatores na prevenção do câncer de cólon e reto. A resposta é consumir a fonte de cálcio em horários diferentes dos da ingestão de fibras.

Também o excesso de gorduras deve ser evitado quando se consome cálcio, pois os ácidos biliares fazem das gorduras uma espécie de “pasta” com a qual o cálcio se mistura, formando sais insolúveis, que não conseguem ser absorvidos e acabam sendo eliminados pelas fezes. Portanto, aos que ingerem, por exemplo, suplementos de Ômega-3, não é recomendável que o cálcio seja tomado em horários próximos à ingestão destes óleos, assim como nenhum dos dois deve ser ingerido na proximidade do consumo de fibras.

A cafeína é uma reconhecida “ladra” de cálcio e considerada uma das substâncias que, devido ao consumo excessivo, induz à osteoporose.

O álcool prejudica a absorção por ser irritante da parede intestinal e aumenta a excreção urinária do cálcio; e como prejudica a formação da vitamina D no fígado, por conseqüência reduz a absorção do mineral.

No tabaco, a nicotina atua na parede dos vasos, prejudicando a absorção, a excreção renal e o transporte do cálcio até aos ossos.

Por outro lado, Lee & Hopkins (4) recomendam que não se tome antiácidos com alumínio e não se use panelas de alumínio, argumentando que já foi bem demonstrado que pequenas quantidades de antiácidos contendo alumínio, assim como partículas microscópicas de alumínio que se desprendem nas panelas, aumentam a excreção urinária e fecal de cálcio e inibem a absorção de flúor e de fósforo, criando um saldo negativo de cálcio – então o cálcio acaba sendo excretado, em vez de ser utilizado.

Já os diuréticos são medicamentos ou substâncias que causam perda de água no corpo; como junto com a água também perdemos minerais, principalmente cálcio, magnésio e potássio, pessoas que fazem muito uso de diuréticos podem desenvolver perda óssea e ter maiores riscos de fraturas.

E Simões et al (2) explicam que, especialmente em adultos, a ingestão de sódio é considerada um fator de risco para a perda urinária de cálcio, e para a reabsorção de cálcio ósseo.


Vitamina D

Sendo a vitamina D, juntamente com o magnésio, substâncias indispensáveis ao metabolismo do cálcio, não podemos deixar de nos referirmos a elas e associá-las aos processos discutidos nesse artigo.

Vitamina D é o nome geral dado a um grupo de compostos lipossolúveis, também conhecidos como calciferol e vitamina antiraquítica, que são essenciais para manter o equilíbrio mineral no corpo. Suas formas ativas principais são a vitamina D2 (ergocalciferol, de origem vegetal) e vitamina D3 (colecalciferol, de origem animal).

Segundo Lee & Hopkins (4), a melhor maneira de se obter vitamina D é através da exposição direta da pele à luz do sol. A luz solar estimula uma cadeia de eventos na pele que leva à produção de vitamina D pelo fígado e pelos rins (é por isso que doenças dos rins e fígado podem causar uma deficiência de vitamina D). A questão é que o estilo de vida da maioria das pessoas hoje em dia, saindo cedo de casa, corpo coberto por roupas e em geral no interior de veículos, e retornando para casa à noite, tem-nas feito perder os benefícios da luz solar. Todavia, a situação se complica ainda mais se as pessoas se expõem ao sol em horários péssimos para a saúde (entre 10h e 16h), sofrendo com o fotoenvelhecimento e arriscando-se a contrair um câncer de pele.

A vitamina D funciona como um hormônio, que dá ordem às células do intestino de produzirem uma proteína, que vai servir de transporte para o cálcio até o sangue, a partir de onde ele chegará às células. É necessária para a absorção do cálcio e do fósforo no intestino grosso, para a sua mobilização a partir dos ossos e a para a sua reabsorção nos rins – com isso a vitamina D tem um papel importante em assegurar o funcionamento correto dos músculos, nervos, coagulação do sangue, crescimento celular e utilização de energia.

Tem sido proposto que a vitamina D é também importante para a secreção de insulina e prolactina, resposta imunitária e ao estresse, síntese da melanina e para a diferenciação das células da pele e do sangue. Sendo lipossolúvel, a absorção de vitamina D também depende da absorção de gordura. Se a pessoa tiver alguma dificuldade na absorção de gorduras, ou se a ingestão da vitamina for sempre simultânea à de fibras (certos tipos de fibras “capturam” gorduras), haverá deficiência desse nutriente no organismo.

A deficiência de vitamina D pode produzir uma variedade de sintomas, como: níveis séricos reduzidos de cálcio e fósforo; aumento da atividade da fosfatase alcalina; fraqueza muscular e tetania; riscos acrescidos de infecção. Em crianças pode haver sintomas como: inquietação, irritabilidade, sudação excessiva, diminuição do apetite. Em idosos, o mais comum são ossos quebradiços. Mas as manifestações mais conhecidas de deficiência de vitamina D são o raquitismo (nas crianças) e a osteomalácia (nos adultos), ambas caracterizadas pela perda de mineral a partir dos ossos, resultando em deformidades do esqueleto; o crescimento pode ser retardado e pode haver mineralização inadequada do esmalte dentário e da dentina.


Magnésio

O papel fisiológico do magnésio é vital, pois atua na duplicação dos ácidos nucléicos, na síntese de proteínas (nenhuma proteína é formada em nosso corpo, a partir dos aminoácidos, sem a presença adequada de magnésio), na transmissão do impulso nervoso, na contração muscular, na coagulação do sangue, na remoção de substâncias tóxicas (por exemplo: amônia), na prevenção de doenças cardíacas e arritmias, na conversão de carboidratos, proteínas e gorduras para produção de energia, na ativação de mais de 400 enzimas que controlam nosso metabolismo etc. Sendo um dos minerais mais abundantes no corpo humano, cerca de 70% se distribui no tecido ósseo e o restante nos tecidos moles (músculos, tecido nervoso, vísceras), no fluido extracelular e nas secreções digestivas. É vital para o metabolismo do cálcio, da vitamina C, do fósforo, do sódio e do potássio.

Lee & Hopkins (4) avisam que sem magnésio o cálcio não consegue formar ossos fortes, e que a deficiência de magnésio pode ser mais comum na mulher com osteoporose do que a deficiência de cálcio. Embora muitas frutas e hortaliças contenham algum magnésio, as fontes mais ricas nesse mineral são os grãos integrais, farelo de trigo, verduras com folhas verdes, castanhas, feijões, banana e damasco. Para ser incorporado aos ossos, o cálcio requer a ajuda de enzimas, as quais precisam de magnésio e vitamina B6 para funcionar adequadamente.

Embora muita gente não saiba, é mais freqüente termos carência de magnésio e de vitamina B6 do que de cálcio, e isso, na maior parte dos casos, se deve aos maus hábitos alimentares que caracterizam a sociedade atual, somados à má qualidade dos solos e do plantio, cultivo, colheita, transporte e acondicionamento dos alimentos, que, por isso, não mais nos garantem os nutrientes que deveriam.

O solo pobre em magnésio e o uso de adubos químicos N.P.K (nitrogênio, fósforo e potássio) são responsáveis pelo déficit de magnésio em muitos alimentos (por antagonismo, o nível de potássio absorvido pela planta inibe a absorção do magnésio). Outros fatores são: consumo excessivo de gorduras saturadas, laticínios e proteínas na alimentação diária; prática de esportes ou de exercícios de alta intensidade, que provocam muita sudorese; regimes de emagrecimento prolongados (a maioria das dietas restringe o consumo de diversos alimentos que são fontes básicas de nutrientes, ao mesmo tempo em que não garantem a reposição dos mesmos com suplementos de alta qualidade e tecnologia; isso gera carência nutricional e conseqüentes enfermidades associadas – reduz-se peso à custa de comprometimento, às vezes sério e silencioso, da saúde); uso habitual de diuréticos e relaxantes; mulheres que fazem uso regular de pílulas anticoncepcionais ou reposição de estrógeno; elevado consumo de bebidas alcoólicas e ou excesso de refrigerantes à base de cola; dietas ricas em carboidratos (açúcares) e sal; estados freqüentes de ansiedade e estresse; consumo exacerbado de cálcio.

Silva et al (5) chamam atenção para o fato de que o magnésio deve ser mantido em níveis adequados principalmente durante a adolescência, visto que é citado como coadjuvante fundamental no processo de mineralização óssea, já que aproximadamente um terço do magnésio corporal encontra-se nos ossos.

Ronsein et al (3) informam que as pesquisas têm demonstrado que pessoas estressadas do tipo agressivas, ambiciosas, competitivas, que vivem sob tensão, têm constante déficit do magnésio muscular. Portanto, uma ingestão adequada de magnésio é essencial para manter as artérias relaxadas, a pressão arterial baixa e os batimentos cardíacos regulares. Esse mineral também reduz os radicais livres, estabilizando a capacidade de aglutinação de plaquetas sangüíneas, de onde se conclui que a carência desse elemento leva o indivíduo a ter maiores chances de trombose. A deficiência pode também levar à anorexia, apatia, náuseas, hiperatividade neuromuscular, tiques nervosos e cãibras, dores de cabeça, vertigens, tremores nas pálpebras, distúrbios glandulares, lentidão no funcionamento do fígado, micções noturnas, problemas de próstata, contrações da vesícula biliar, inibição da síntese de DNA e RNA, desorientação, fadiga, insônia, calcificação nos tecidos, arritmias cardíacas e até mesmo parada cardíaca.

Como os rins excretam o magnésio com muita facilidade, raramente irá ocorrer intoxicação por excesso do mesmo; mas, caso extraordinariamente aconteça, especialmente quando se usa suplementos de baixa qualidade e sem garantia de alta tecnologia de produção, o excesso pode levar ao colapso do sistema nervoso central.

O cálcio e o magnésio formam importantíssimo equilíbrio entre líquidos extra e intracelulares. Quando existe uma carência de magnésio, o cálcio se desequilibra e, em lugar de se fixar nos ossos, é eliminado ou se deposita em várias partes do organismo. Com o tempo, vai formando calcificações como, por exemplo, nas paredes das artérias, causando a arteriosclerose; nas articulações ósseas; nos rins e na vesícula, formando "pedras"; nos seios e nos pulmões, formando cistos; como sua carência gera maior probabilidade de aglutinação de plaquetas, predispõe o indivíduo a coágulos e conseqüentes tromboses, provocando sintomas de perda de memória, da visão e transtornos da audição, mesmo em pessoas jovens.


Suplementação nutricional

Argumentam Simões et al (2) que muitas vezes é difícil obter a quantidade necessária de cálcio apenas pela dieta, pelo que indicam a suplementação através dos sais mais comumente utilizados, que são os de carbonato de cálcio. Esses contêm 40% de cálcio elementar e precisam de meio ácido para ser solubilizados, sendo ideal se forem ingeridos durante as refeições.

Estudos mostraram que o tratamento, durante dois anos, com cálcio e vitamina D aumentou a massa óssea, e esse aumento foi detectado através da avaliação ultrassonográfica em pessoas idosas. É feito, entretanto, o alerta de que o cálcio fabricado em laboratório não se absorve bem, porque não é orgânico, daí a necessidade de se ter garantia de um suplemento de alta tecnologia e qualidade, salvaguardado por uma companhia composta por um corpo científico renomado na área cujos membros tenham um nome e uma carreira a zelar, de preferência ligados a universidades de ponta, em contraposição ao lobby alopático da indústria farmacêutica e em sentido contrário ao de empresas nacionais e internacionais produtoras de suplementos e que, visando apenas o lucro, produzem suplementos de baixa biodisponibilidade, não raro acrescidos de substâncias químicas prejudiciais e contaminantes.

Embora muitos médicos ainda receitem apenas a combinação do cálcio com vitamina D, pelos motivos já exaustivamente expostos, a associação com magnésio é imprescindível, inclusive evitando a tendência à constipação e à deposição do cálcio excedente que forma cálculos renais. Os autores referidos citam, ainda, a importância de suplementação de vitamina D para favorecimento da formação óssea e da absorção intestinal do cálcio, fosfato e magnésio, produzindo resultados de aumento da massa óssea e diminuição do risco de fraturas.

Zaire et al (10) dizem que o ideal seria que o carbonato de cálcio fosse tomado junto com as refeições, pois ao chegar ao estômago, ele é transformado em cloreto de cálcio; com o aumento da secreção ácida estomacal, que acontece logo após a refeição, mais cloreto de cálcio se forma. O cloreto de cálcio é solúvel e absorvível, enquanto o carbonato não é, por isso o aproveitamento do primeiro é bem melhor. Entretanto, se a refeição for rica em fibras, como na realidade deve ser quase sempre, a ingestão concomitante do cálcio não é adequada, pois as fibras reduzirão a absorção do mineral. A solução é consumir o cálcio no intervalo entre as principais refeições, mas de preferência junto com algum alimento não-fibroso que estimule a secreção gástrica. Ao mesmo tempo, o carbonato de cálcio não deve ser ingerido com frutas ácidas (limão, laranja, abacaxi, acerola etc.) nem com espinafre ou cereais, pois o ácido oxálico (oxalato) presente nos primeiros e os fitatos, presentes nos últimos, se ligam ao cálcio e diminuem a sua absorção. A cafeína também deve ser evitada, pois aumenta a excreção urinária de cálcio.

Quando se consome cálcio em demasia pode-se chegar à hipercalcemia, uma doença caracterizada pela calcificação excessiva dos ossos e dos tecidos moles, podendo ocorrer formação de cálculos renais. Nesse sentido, mesmo se sabendo que o consumo adequado de cálcio, incluindo sua suplementação, é fundamental para a saúde, é importante se observar a dosagem diária somando-se o cálcio dos alimentos e o dos suplementos, a fim de evitar que se atinja um nível que o torne prejudicial. Simões et al (2) avisam que pacientes com história familiar ou portadores de calculose renal e aqueles com sintomas de hipercalcemia, tais como fadiga, fraqueza muscular, depressão, alteração de memória e de personalidade, anorexia, náuseas, vômitos, constipação, úlcera péptica e pancreatite recorrente, entre outros, devem ser avaliados metabolicamente por médicos antes da administração de suplementos de cálcio.

Simões et al (2) citam avaliações de retenção de cálcio em adolescentes entre 12 e 15 anos, cuja conclusão foi que, para essa faixa etária, a ingestão de cálcio deve ser de 1200 a 1500mg/dia, para garantir boa retenção do mineral. De forma similar, a Dietary Reference Intakes (DRI) de 1998 recomendam 1300mg/dia para adolescentes. O Instituto Nacional de Saúde (NIH) estabeleceu que a ingestão "ótima" de cálcio deve ser de 800mg/dia para crianças de 3 a 8 anos e 1300mg/dia para crianças e adolescentes de 9 a 17 anos, sendo recomendada a manutenção de 1000 a 1500mg/dia após essa fase da vida. O Dr. Strand recomenda uma dosagem suplementar diária de 800 a 1.500mg de cálcio (1).

Também de acordo com Simões et al (2), embora seja relativamente raro de acontecer, os efeitos colaterais que podem ocorrer com a suplementação de vitamina D são hipercalcemia (sintomas recentes: constipação severa, secura na boca, dor de cabeça, depressão, gosto metálico na boca, etc.; sintomas tardios: confusão, sonolência, aumento da sensibilidade dos olhos e pele à luz, especialmente em pacientes que fazem hemodiálise, etc.); hipercalciúria; hipotensão (tonturas); danos renais; retardamento de crescimento; calcificação de tecidos moles; irritabilidade).

Em geral se considera uma dose tóxica de vitamina D para um adulto em torno de 2,5 mg (100.000 IU) diariamente durante 1 a 2 meses; para as crianças a dose tóxica está entre 0,5 mg (20.000 IU) e 1,0 mg (40.000 IU). No entanto, certos indivíduos têm uma sensibilidade elevada à vitamina D e apresentam sintomas de toxicidade com apenas 50 mcg (2.000 IU). É preciso, porém, chamar atenção para o fato de que, com as formulações contendo teores equilibrados de cálcio, vitamina D e magnésio, e que garantam a qualidade e a alta tecnologia, dificilmente essas substâncias atingirão níveis de excesso.

A dose mais usualmente recomendada de ingestão diária de vitamina D é de 5 microgramas. A partir de 50 anos deve-se subir para 10 microgramas, e com mais de 70 anos, 15 microgramas. O Comitê de Alimentação e Nutrição do Conselho Nacional de Investigação Americano recomenda uma ingestão diária de 5 mcg (200 IU) para adultos, 7,5 mcg (300 IU) para bebês com menos de 6 meses e 10 mcg (400 IU) para crianças com mais de 6 meses, grávidas e mães a amamentar. Um suplemento diário de 5 a 7,5 mcg (200 – 300 IU) é recomendado para bebês alimentados com leite materno que não tenham exposição ao sol. Mas a recomendação para adultos varia de acordo com o país, indo de 2,5 mcg (100 IU) a 11,5 mcg (450 IU). A recomendação mais elevada existe na França (20 a 30 mcg por dia para crianças de raça negra). O Dr. Strand recomenda uma dosagem suplementar diária de 800 IU de vitamina D (1).


Conclusão

Feita uma avaliação criteriosa dos fatores que influenciam a carência, o consumo, a biodisponibilidade e a efetividade do cálcio no organismo, e sua relação com a vitamina D e o magnésio, conclui-se, com base em parte da literatura médico-científica, que é relativamente comum o déficit desses nutrientes em grande parcela da população. Em face disso, os especialistas recomendam a ingestão de suplementos nutricionais contendo essas substâncias, contudo com a ressalva de que os elementos estejam dentro das combinações e dos teores perfeitamente equilibrados para a melhor biodisponibilidade dos mesmos; que sejam suplementos de alta tecnologia e excelente qualidade, e formulados e garantidos por um Conselho Médico-Científico de renome. O consumo desses suplementos deve obedecer a uma mudança, se for o caso, de hábitos alimentares e de estilo de vida que causam a perda dos nutrientes envolvidos.


Referências

1. Strand, Ray D. O que seu médico não sabe sobre medicina nutricional pode estar matando você. M. Books do Brasil Editora, São Paulo, SP, 2004.

2. Simões, C. M. O.; Ganske, J.; Morais, M. B. M. Osteoporose - Existe tratamento para a osteoporose? Em: http://www.saudeemmovimento.com.br/conteudos/conteudo_exibe1.asp?cod_noticia=70. UFSC, 2002.

3. Ronsein, G.E.; Dutra, R.L.; Silva, E.L.; Martinello, F.; Hermes, E.M.; Balen, G.; Jorge, S.; Waltrick, C.D.A.; Silva, C.S.M.; Santos, B.M.; Leal, V.; Roldão, U. Q.; Cantos, G.A. Influência do estresse nos níveis sanguíneos de lipídios, ácido ascórbico, zinco e outros parâmetros bioquímicos. Acta Bioquím. Clín. Latinoam., v.38, n.1, La Plata, 2004.

4. Lee, John R.; Hopkins, Virginia. Osteoporose - Uma doença incapacitante, que pode ser evitada e revertida. Em: http://us.geocities.com/novatrh/osteo.html .

5. Silva, C. C. da; Teixeira, A. S.; Goldberg, T. B. L. Impacto da ingestão de cálcio sobre a mineralização óssea em adolescentes. Rev. Nutr. vol.17 no.3, Campinas, SP. 2004

6. Echevarría, Wihelma; Leite, M. Fatima; Guerra, Mateus T.; Zipfel, Warren R.; Nathanson, Michael. Regulation of calcium signals in the nucleus by a nucleoplasmic reticulum. Nature Cell Biology 5, 440 - 446 (2003).

7. Melo, Adriana. Elucidação de nova estrutura celular tem participação brasileira. Ciência Hoje on-line, em: http://cienciahoje.uol.com.br/controlPanel/materia/view/1820, 2003.

8. Azevedo, A. L. Brasil descobre como fazer remédio melhor. Jornal da Ciência. Em: http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=10414. 09 de Junho de 2003.

9. Arioli, Edson L.; Correa, Pedro Henrique S. Hipocalcemia. Arq Bras Endocrinol Metab, vol.43, nº.6, p.467-471, 1999.

10. Zaire, C. E. F.; Gomes, M. das N,; Seidler, R. S. Informativo sobre o medicamento carbonato de cálcio pó. Centro Regional de Informação de Medicamentos, UFRJ, Rio de Janeiro, RJ.

Indicação de leitura

Marchini, J. S.; Ferrioli, E.; Moriguti, J.C. Suporte nutricional no paciente idoso: definição, diagnóstico, avaliação e intervenção. Medicina, Ribeirão Preto, 31: 54-61, 1998.

Os ômega-3 e a saúde humana

Ricardo B. Marques
Biólogo. Professor de Biologia Celular e Molecular. Membro da American Society for Biochemistry and Molecular Biology (ASBMB, USA), e da Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento (SBNeC).


Os hábitos alimentares e os ácidos graxos essenciais

Óleo é um tipo de gordura. E gordura costuma ter certa má fama entre a maioria das pessoas, mas é preciso lembrar que o mal está nos excessos. Além disso, há lipídios que são indispensáveis para a saúde do organismo. Por exemplo, a família dos ácidos graxos poliinsaturados (PUFA – Polyunsaturated Fatty Acids), que são conhecidos como “óleos essenciais”, ou, mais corretamente, “ácidos graxos essenciais” (EFA – Essential Fats Acids). Esse nome é porque, assim como as vitaminas, eles são vitais para nós, mas não podem ser produzidos pelo corpo; assim, precisam ser obtidos na alimentação.

Só que há um problema: com as mudanças nos hábitos alimentares que a sociedade tem provocado ao longo dos últimos tempos, os níveis de alguns desses ácidos graxos essenciais (EFA) na dieta cotidiana têm se tornado criticamente baixos. Enquanto isso se observa um cada vez mais perigoso aumento de gorduras saturadas, as consideradas verdadeiramente “más”.

Os EFA são divididos em dois grupos: os do tipo Ômega-6 e os do tipo Ômega-3. O organismo converte parte dos Ômega-3 em substâncias anti-inflamatórias, e parte dos Ômega-6 em substâncias pró-inflamatórias. Precisamos de ambos, e um tipo não pode ser transformado no outro; conseqüentemente, os dois precisam constar da nossa dieta de forma balanceada, para que tenhamos boa saúde, pois é fácil concluir que o excesso de Ômegas-6 piora doenças inflamatórias, e o excesso de Ômega-3 reduz essas doenças. Entretanto, o equilíbrio entre os dois não é o que se tem observado.

Na verdade, os níveis de Ômega-6 têm, cada vez mais, aumentado na dieta, em contraposição aos níveis de Ômega-3, que têm caído sistematicamente. O ideal seria que a proporção entre os dois grupos de substâncias fosse de 1:1, ou, no máximo, de 4:1 (quatro partes de Ômega-6 para uma de Ômega-3), mas a realidade é que, numa média mundial, a diferença está em torno de 12:1, e na dieta ocidental, chega a atingir 45:1! Entre as principais razões desse descontrole estão: o consumo exacerbado de óleos extraídos de plantas de clima quente, deficientes em Ômega-3, como o milho, o girassol e o gergelim; a hidrogenação de óleos no processo de industrialização (para aumentar a durabilidade); o consumo decrescente de peixes e frutos do mar; a perda de germens dos cereais que contém ácidos graxos, devido às práticas modernas de moagem; aumento de 2.500% na ingestão de ácidos graxos TRANS, ainda muito utilizados na indústria (margarinas, biscoitos, sorvetes etc.) e que, além de outros problemas graves que causam, interferem na absorção e na síntese de Ômega-3; aumento de 250% na ingestão de açúcares refinados, que interferem negativamente nas enzimas que sintetizam Ômega-3; entre outros.

Conhecendo a grande importância dos Ômega-3 para a saúde, sua carência é vista como um dos principais motivos para o aumento de várias doenças no mundo, especialmente as crônico-degenerativas de caráter inflamatório.

Falando agora somente nos Ômega-3, dizemos que eles formam uma família também de dois grupos: o de cadeia curta e o de cadeia longa. O de cadeia curta é o ALA (ácido alfalinoléico), presente em alguns alimentos vegetais, incluindo óleos como o de linhaça e canola. O grupo de cadeia longa é composto pelo EPA (ácido eicosapentaenóico) e o DHA (ácido docosahexaenóico), que são sintetizados por minúsculos organismos vegetais marinhos, os fitoplânctons, mas são encontrados em peixes marinhos de águas frias e profundas, como salmão, sardinha, cavala, arenque, bacalhau, anchova, entre outros, que se alimentam de fitoplânctons, e também em certos frutos do mar, a exemplo de lagostas e camarões.

Embora se saiba que o ALA, obtido em vegetais, é convertido em EPA e DHA dentro do nosso organismo, pairam sérias dúvidas sobre se as fontes vegetais de Ômega-3 podem efetivamente suprir as quantidades de EPA e DHA requeridas para a saúde. Daí a exigência de consumo de alimentos que já sejam, eles mesmos, ricos em EPA e DHA.

Mas há uma dificuldade nesse ponto. Por exemplo, o Dr. Nataniel Viuniski, um dos maiores especialistas brasileiros em obesidade infantil, e membro do Conselho Médico-Científico da Herbalife, chama a atenção para a realidade cotidiana (1): “No dia-a-dia agitado que vivemos no século XXI, fica muito difícil incluirmos esses peixes ricos em Ômega-3 na nossa dieta, pois, além de caros, são difíceis de encontrar e não fazem parte do cardápio típico do brasileiro”. Outro alerta, lançado pelo Dr. Nataniel, dirige-se às pessoas que fazem dieta para controle de peso: “muitas pessoas diminuem drasticamente a ingestão de gorduras quando querem controlar seu peso, privando o organismo dos ácidos graxos essenciais”. Uma dieta que siga um programa nutricional sério, científico, associado a suplementos que garantam a saúde, torna-se, por isso, uma necessidade.

Evidências científicas dos efeitos benéficos dos Ômega-3

Pesquisas realizadas na UNESP (Universidade Estadual Paulista), em Botucatu, SP, confirmaram aquilo que a literatura científica mundial vinha demonstrando: os ácidos graxos Ômega-3, quando incorporados à alimentação, tornam-se um importante aliado na prevenção de doenças do coração e funcionam como alternativa aos medicamentos antiinflamatórios.

Essas conclusões resultam de teses defendidas na Faculdade de Medicina da UNESP e constam de artigo publicado no Informativo Proex (2), da própria Universidade. O referido artigo cita o professor Roberto Carlos Burini, chefe do Centro de Metabolismo e Nutrição da Faculdade de Medicina da UNESP (Botucatu), que afirma: “(...) O W-3 (Ômega-3) colabora em 50% na redução de doenças do coração e também auxilia em 40% na redução da inflamação". O artigo acrescenta, ainda, que estudos realizados com pacientes portadores de retocolite ulcerativa, pênfigo foliáceo (“fogo selvagem”) e artrite reumatóide demonstraram efeitos biológicos positivos dos Ômega-3 sobre tais enfermidades, inclusive produzindo diminuição dos níveis de colesterol e, principalmente, de triglicerídeos.

Na mesma fonte encontra-se referência aos benefícios dos Ômega-3 em esportistas e atletas: uma vez incorporados à alimentação, os esportistas obtêm melhor desempenho aeróbico, isto é, conseguem um aumento da capacidade de seu organismo em absorver oxigênio, porque os Ômega-3 atuam na diminuição da viscosidade sangüínea. Fica entendido, portanto, que estes ácidos graxos colaboram para que haja ganhos na distribuição de oxigênio e nutrientes pelos músculos e demais tecidos do corpo. Explica o Dr. Burini: "Ingerindo-se cerca de 4g de W-3 diariamente, por pelo menos três semanas, já é possível obter os efeitos benéficos deste ácido graxo".

Por sua vez, o The Cancer Council (Conselho de Câncer), da Austrália, publicou em janeiro de 2006, com revisão em maio, o Health Professionals Summary – Omega-3 fatty acids, fish and cancer prevention 3 (Ácidos graxos Ômega-3, peixes e prevenção do câncer), onde são feitas referências importantes ao papel altamente positivo desses lipídios na prevenção e/ou contenção de diversas doenças que acometem o ser humano. É dito, por exemplo, que: “Há evidências limitadas, porém sugestivas, de associações entre o aumento do consumo de peixes e a redução de riscos de câncer de seio, de reto e de próstata, e entre uma elevada proporção de ácidos graxos Ômega-3 e ômega-6 na dieta e a redução de câncer de seio. (...) A evidência científica confirma claramente que pessoas que incluem ácidos graxos Ômega-3 provenientes de ambas as fontes, marinha e vegetal, como parte de uma dieta balanceada, experimentam um leque de melhorias nas condições de saúde. Os ácidos graxos Ômega-3 são conhecidos por ajudarem a reduzir o risco de doenças do coração, reduzir os triglicerídeos e aliviar estados inflamatórios como a artrite reumatóide e a doença inflamatória do intestino”.

No referido trabalho o Conselho de Câncer recomenda que as pessoas comam peixe (preferivelmente óleo de peixe) no mínimo duas vezes por semana, e incluam alguns alimentos e óleos vegetais ricos em ácidos graxos ômega-3 em sua dieta. Ressalta que “essas recomendações são consistentes com os Fundamentos do Coração (Heart Foundations) em todo o mundo e com o Guia de Dieta para Adultos Australianos (Dietary Guidelines for Australian Adults)”.

Já no seu COMA Report – Committee on Medical Aspects of the Food and Nutrition Policy (4) (Relatório COMA – Comitê para Aspectos Médicos da Política de Nutrição e Alimentos), o Departamento de Saúde (Department of Health), assim como a AHA - American Heart Association (5) (Associação Americana para o Coração) recomendam o consumo mínimo de duas refeições de peixe por semana, onde pelo menos uma das quais precisa ser rica em óleo de peixe (como sardinhas, cavala e arenque). Já para pessoas que não gostam de peixe, é recomendado que seja tomado um suplemento de óleo de peixe com alto nível de Ômega-3, o que supriria, nesse aspecto, as necessidades de proteção à saúde proporcionada pelo consumo de peixe em si.

Dentre os efeitos altamente positivos dos Ômega-3, faz-se referência, por exemplo, ao fato de que eles reduzem o risco de formação de coágulo sangüíneo no interior dos vasos – efeito semelhante ao da aspirina, mas sem os efeitos colaterais desse medicamento. Isso ajuda o sangue a fluir mais livremente, e reduz o risco de um coágulo sangüíneo bloquear artérias coronárias estreitadas, o que poderia resultar em ataque cardíaco potencialmente fatal. Cita-se, ainda, que estimulam os músculos que revestem as paredes das artérias a relaxar, facilitando o fluxo sangüíneo; aumentam os níveis de HDL (“bom colesterol”) e reduzem outros lipídios sangüíneos que são prejudiciais; ajudam a reduzir a pressão sangüínea; previnem arritmias cardíacas (batimentos cardíacos irregulares), entre outras benesses. Pesquisadores também têm relatado que a suplementação de óleo de peixe pode prevenir a reincidência no fechamento das artérias coronarianas (restenose) em pacientes submetidos a angioplastia (cirurgia para abrir artérias estreitadas).

Do mesmo modo que reduzem o risco de ataque cardíaco – através do “afinamento” do sangue, protegendo contra coágulos –, os Ômega-3 podem proteger contra derrames. A maioria dos derrames (85%) resulta de um coágulo sangüíneo (trombose) bloqueando uma artéria no cérebro. Entretanto, ao mesmo tempo em que os Ômega-3 são necessários e excelentes para prevenir derrames, é preciso que se alerte para o fato de que suplementos contendo esses ácidos graxos precisam ser de altíssima qualidade, respaldados por médicos e cientistas de referência, e devem ser consumidos em doses apropriadas – isso porque, assim como a aspirina, doses exageradas de Ômega-3 podem “afinar” demais o sangue e aumentar o risco de hemorragias em casos específicos de problemas de saúde.

Na Conferência de Biologia Experimental de 2002, nos EUA, foram apresentados resultados (6) de pesquisas biomédicas revelando que o óleo de alguns peixes, rico em Ômega-3, produziu um significante aumento na sensibilidade à insulina em pacientes com sobrepeso. Isso significa que os Ômega-3, se consumidos apropriadamente na alimentação rotineira, e/ou obtidos com suplementos de alto nível de confiabilidade, reduzem os riscos da resistência à insulina e do desenvolvimento de síndrome metabólica, considerada hoje a maior causa de doenças cardiovasculares, entre outras.

De acordo com o American Journal of Clinical Nutrition (7), pesquisadores estudaram como o óleo de peixe afeta uma molécula chamada “fator de necrose tumoral-alfa” (TNF – tumor necrosis factor-alpha), conhecida por ser o “gatilho” inflamatório do corpo. O resultado indicou que o óleo de peixe age como substância antiinflamatória ao suprimir a capacidade do organismo de produzir TNF. Por isso os Ômega-3 apresentam efeitos tão marcantes na prevenção e/ou redução dos sintomas das artrites e de outras enfermidades de origem inflamatória.

Em resumo, eis uma lista dos benefícios diretos e indiretos proporcionados pelo consumo regular de Ômega-3, com base na literatura científica atual:

  • Redução dos processos inflamatórios no organismo
  • Redução dos níveis sangüíneos de triglicerídeos (gorduras) e dos níveis sangüíneos de LDL (“mau” colesterol) e aumento do HDL (“bom” colesterol)
  • Redução do desenvolvimento de resistência à insulina e de síndrome metabólica
  • Controle/redução da pressão arterial; prevenção de arritmias cardíacas
  • Promoção do desenvolvimento cerebral de fetos e recém-nascidos (o DHA é um dos principais componentes de estruturas cerebrais) e regulação de diversas funções cerebrais também em adultos, influenciando no humor, coordenação e capacidade de aprendizagem; têm sido observados efeitos benéficos sobre certos casos de depressão e de esquizofrenia
  • Relaxamento dos músculos que revestem as paredes das artérias, facilitando o fluxo sangüíneo
  • Prevenção da reincidência no fechamento das artérias coronarianas (restenose) em pacientes submetidos a angioplastia
  • Redução da agregação plaquetária; redução do risco de trombose e embolias; prevenção de derrames e outros acidentes vasculares
  • Proteção do endotélio (parede dos vasos sangüíneos); prevenção primária e secundária da aterosclerose
  • Coadjuvante no tratamento de várias doenças, como a doença inflamatória do intestino, retocolite ulcerativa, pênfigo foliáceo, artrite reumatóide, lupus, algumas desordens renais, diversos problemas inflamatórios de pele (psoríase, eczemas etc.), doença de Chrohn, entre outras
  • Fortalecimento e manutenção da integridade da retina; ajuda na melhoria da acuidade visual
  • Estimulação do sistema imunitário
  • Prevenção de alguns tipos de câncer, como o de seio, de reto e de próstata

Uma dificuldade que se agrava nos últimos tempos é que a poluição marinha está aumentando drasticamente, contaminando os ecossistemas até em alto mar. O fitoplâncton, produtor dos Ômega-3, é quem primeiro sofre as conseqüências, acumulando toxinas e metais pesados, como o mercúrio, em seus organismos, fixando-os junto aos ácidos graxos. Os animais marinhos que se alimentam do fitoplâncton absorvem esses poluentes, que se reúnem às substâncias tóxicas já presentes no organismo desses animais, pelo fato destes também viverem no ambiente poluído, pois nas águas profundas há considerável deposição de metais pesados. Estes e outros elementos perigosos à saúde se fixam justamente nos óleos que o peixe armazena em seu organismo. Por conseguinte, quando se come esses animais, adquire-se também toda essa carga de contaminantes para o corpo, resultando em intoxicações e doenças diversas, em médio e longo prazo.

Por outro lado, quando esses óleos contaminados são extraídos dos animais para encapsulação e comercialização na forma de suplementos, as toxinas e poluentes vão junto, de maneira que o consumo dos suplementos se torna também um risco. Ao mesmo tempo, quando os tipos especiais de peixes que fornecem Ômega-3 são criados em cativeiro, alimentados com ração – aliás, principal origem de grande parte dos peixes consumidos hoje –, evidências indicam que os ácidos graxos não mantêm todas as suas propriedades funcionais, além de mostrar-se difícil garantir a adequada proporção de Ômega-3 nos organismos dos peixes, diferente do que acontece no ambiente natural.

O próprio descobridor dos Ômega-3 (8), e indicado ao Prêmio Nobel, Dr. George Pigott, PhD, membro do Conselho Médico-Científico da Herbalife, professor de Engenharia de Alimentos, fundador e diretor do Institute of Food Science and Technology (Instituto de Ciência e Tecnologia de Alimentos), do College of Aquatic and Fishery Sciences (Faculdade de Ciências Aquáticas e de Pesca), Universidade de Washington, analisa (9) como a tecnologia e as práticas comerciais de cultivo afetam o valor nutricional de certos peixes, moluscos, crustáceos e plantas de água doce. O Dr. Pigott tem sido considerado uma das maiores autoridades mundiais nessa área, com diversos artigos e livros publicados, onde estuda e sugere medidas apropriadas de captura, transporte, armazenamento, processamento e distribuição de alimentos de origem aquática, de maneira a reduzir as perdas nutricionais.

Fica a pergunta: como fazer para garantir a saúde humana com o consumo adequado de Ômega-3 se o acesso aos mesmos passa por riscos de se adoecer por contaminação, e se o óleo proveniente de peixes de cativeiro não mantém as mesmas propriedades? Ficou demonstrado que a suplementação diária é imprescindível. Mas aqui reside uma dificuldade: nem todos os suplementos são saudáveis nem dignos de confiança, pois o processo para extração deve ser de alta tecnologia, e rigoroso na eliminação dos contaminantes, assim como precisa ser garantida a origem dos peixes de onde o óleo é extraído: obrigatoriamente de águas frias e profundas, alimentados com fitoplâncton. É preciso, então, que na hora de se escolher o suplemento se garanta que o mesmo seja obtido e processado por uma companhia séria, através de uma altíssima tecnologia de refinamento do óleo que extraia 100% de quaisquer toxinas e poluentes presentes no organismo dos animais marinhos, e que essa rara qualidade seja garantida por um Conselho Médico-Científico de reputação ilibada e que responda científica e tecnicamente pela mesma.

Enxerga-se aí o limitador de que, por enquanto, só se conhece uma companhia no mundo detentora desse exclusivo processo de alta tecnologia, e que tenha o nível requerido de rigor, responsabilidade e seriedade na produção de suplementos à base de Ômega-3; igualmente, tal companhia é a única dotada de um Conselho Médico-Científico que atende aos requisitos de extrema confiabilidade e elevada reputação, cujo número de integrantes é superado apenas pelo Conselho Médico-Cientifico da OMS (Organização Mundial de Saúde) e seus integrantes são pesquisadores e dirigentes dos melhores centros universitários de Nutrição Humana, a exemplo do Centro de nutrição Humana da UCLA (Universidade da Califórnia), incluindo laureados com o prêmio Nobel de Medicina. Dentre eles, conforme observado, encontra-se o próprio Dr. George Pigott, descobridor dos Ômega-3.

Conclusão

A conclusão final pode ser resumida em quatro pontos:

1. Pessoas saudáveis necessitam consumir rotineiramente quantidades adequadas de ácidos graxos Ômega-3, tanto para prevenir quanto para controlar e/ou reduzir diversos tipos de doenças cujo índice tem aumentado em muitos países, especialmente no Brasil.

2. A maioria das pessoas não inclui esses ácidos em seu dia-a-dia, tornando-se fortes candidatas ao desenvolvimento de tais enfermidades, e aquelas já acometidas por tais doenças, pela carência de Ômega-3 tendem a piorar gradativamente.

3. A solução mais plausível e recomendada por médicos e cientistas da área é o consumo regular de suplementos de Ômega-3.

4. A escolha dos suplementos deve se mirar na garantia da melhor e mais alta qualidade e tecnologia existente de refinamento e produção, com respaldo de médicos e cientistas conhecidos e de absoluta confiabilidade, que se responsabilizem pelas formulações e pela origem e processamento do produto.


Referências

1. Viuniski, N. Ômega-3 e a Nutrição Inteligente. HerbalifeToday, Herbalife do Brasil, 2005; 18.
2. http://proex.reitoria.unesp.br/informativo/WebHelp/2002/edi__o06/edi06_arq12.htm (O Informativo Proex é uma publicação da UNESP cujo objetivo é divulgar as principais ações da Pró-Reitoria de Extensão Universitária).
3. The Cancer Council. Health Professionals Summary - Omega-3 fatty acids, fish and cancer prevention (Developed January 2006 and Reviewed May 2006). Em: http://www.nswcc.org.au/html/healthprofessionals/nutrition_physical/downloads/omega3_hp_summary.pdf#search=%22COMA%20report%20omega%203%22
4. United Kingdom Department of Health. Nutritional aspects of the development of cancer. Relatório do grupo de trabalho sobre dieta e câncer do Comitê para Aspectos Médicos da Política de Nutrição e Alimentos (Committee on Medical Aspects of the Food and Nutrition Policy. Committee on Medical Aspects of the Food and Nutrition Policy, editor. 1998. Norwich, UK, The Stationery Office.
5. Kris-Etherton, P.M., Harris, W.S., Appel, L.J. AHA Scientific Statement: Fish Consumption, Fish Oil, Omega-3 Fatty Acids and Cardiovascular Disease. Circulation: Journal of the American Heart Association, 2002; 106: 2747-2757
6. Denkins, Y. Pennington Biomedical Research Institute, Louisiana State University Baton Rouge. Experimental Biology 2002 Conference, April 20, 2002.
7. Grimble, B., et al. The ability of fish oil to suppress tumor necrosis factor alpha-production by peripheral blood mononuclear cells in healthy men is associated with polymorphisms in genes that influence tumor necrosis factor alpha-production. American Journal of Clinical Nutrition; 76, 454-459.
8. Pigott, G. M. and Tucker, B. W. (1987). Science opens new horizons for marine lipids in human nutrition. Food Review International, 3, 105-138.
9. Piggot, G. M.; Tucker, B. W. Seafood: Effects of Technology on Nutrition. Marcel Dekker Inc., USA, 1990.

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Amada de minh'alma! (à minha amada esposa - III)

Usando termos bíblicos: “Ó amada de minh’alma!”.

Pois é isso que você é, minha querida – amada não só pelos meus sentimentos, pelo meu coração, pela minha mente... Mas pela minha alma.

Quando penso em você, não se trata de um simples homem que se apaixonou e que gosta de sua esposa; sou, antes, um simples homem cuja alma inquieta encontrou a parte que lhe faltava, a parte linda, alegre, o encaixe perfeito.

Assim que a vi, Ana Carmem, minha alma a amou. Não a amei primeiro só com a mente, nem só com o físico – foi coisa da alma. Somente assim posso explicar a convicção que tive quando, sem jamais tê-la visto, sem sequer saber seu nome, sem conhecer nada de você, minha alma falou: “esta será minha esposa querida, a mãe de meus filhos”. Nosso destino estava selado, e mesmo sem nos conhecermos, nenhum de nós podia fugir dele.

Hoje, olho para trás e vejo a bondade de Deus comigo, ao me presentear com a melhor companheira que um homem poderia querer. Olho para frente, e vejo como Deus tem planos maravilhosos para nossa família. Nem quero saber se estarei aqui ou não, só sei que, nesses anos todos, Deus construiu uma mulher-mãe virtuosa, batalhadora, forte, inteligente, paciente, capaz e, sobretudo, lindíssima – por dentro e por fora. Poderia eu, e nossos filhos, termos privilégio maior? Meu coração está sereno, confiante de que, se estarei com vocês, vou compartilhar com nossos filhos tudo de bom que você é e tem pra dar – e queremos também dar-lhe tudo de bom que pudermos; se não estarei, continuo confiante de que nossos filhos têm a melhor pessoa do mundo para estar com eles: Ana Carmem, o exemplo de mãe.

Sou pecador, sim, meu amor. Peco tantas vezes, inclusive quando falho com você, em nosso relacionamento. Poderia me conformar dizendo que é desse jeito mesmo, que Deus ensina que somos todos pecadores e assim continuaremos até a volta de Jesus... Poderia me justificar dizendo que problemas e responsabilidades grandes demais para meu pobre espírito me atrapalham as emoções e acabo pecando até contra quem amo. Mas não seria justo me defender assim.

Cada vez que peco contra você, esposa e mãe maravilhosa, meu coração fica moído, e nunca sei como reparar meu erro – às vezes, isso pode até me levar a outro erro. Meu amor por você, porém, só cresce a cada dia.Saiba, “ó amada de minh’alma”, que, para mim, você é inigualável. Obrigado por tudo que você tem sido em minha vida e, especialmente, na vida de nossos filhos.

Nesse Dia das Mães, ninguém no mundo merece ser louvada mais do que você.

Lá, de dentro do meu íntimo, minha alma profetiza: “Bem-aventurada esta mulher, Ana Carmem, serva do Deus Altíssimo, pela esposa e mãe maravilhosa que ela tem sido”. E minha alma sorri, alegre e tranqüila, por estar completa, com a parte que me faltava: a alma de Ana Carmem, minha mulher, mãe de meus filhos...

Minha vida é sua, meu amor. Amo você mais do que tudo.

Sempre seu,

Ricardo.

(Dias das Mães, 14/05/2006)

Olhei para ti (à minha amada esposa - II)

(1)

Ricardo Marques

Olhei para ti, um dia.

Em teu sorriso vi esplendor,
E em teus olhos, meiguice.
Em teus cabelos esvoaçantes vi liberdade,
Em teu corpo perfeito, arte.

Cativaste meu coração,
Aprisionaste minh’alma,
Embriagaste-me a mente,
Tiraste-me a razão.

Olhei para ti, um dia.
Olho para ti, agora. Nada mudou.

Teu espírito livre, tua beleza indômita,
Teu amor sem preço, tua força ímpar,
São dos céus um presente,
De Deus, infinita graça.

Românticos namorados contemplam belezas.

Da imensidão do mar, admiram-se.
Com a distante lua, impressionam-se.
Do espaço e suas estrelas, quanto mistério!
Mas quando olho para ti, amada minha,
Vejo a lua e o mar juntos,
E todo o espaço com eles, unidos,
A expressarem a tua essência.

Olhei e olho para ti. Continuas a arrebatar-me,
Com todos os meus sentidos tomados,
Coração e mente dominados,
Pelo poder da tua presença,
Pela intensidade da tua vida,
Pelo bem que me trouxeste,
Pelo amor que me ensinaste...

(1) Palavras escritas de improviso em homenagem à minha esposa, Ana Carmem, na comemoração do dia dos namorados em 2003, do nosso grupo de casais.

Mais que à vida... (à minha amada esposa - I)

Mais que à fama, mais que à riqueza... Mais que à vida...

Minha querida esposa:

Desde que te vi pela primeira vez, algo celestial invadiu-me o peito. Em inusitado ardor, meu coração apossou-se de minha mente e, juntos, pensaram: “é ela!”.

Nem mesmo sabia teu nome, mas sabia seres tu aquela pessoa única e especial pela qual vinha esperando toda a vida...

A sensação daquele instante renova-se cada dia que acordo ao teu lado. Ao olhar-te, vejo aquela que, hoje mulher, guarda ainda inalterado o especial semblante que a faz única, um “jeitinho” que mescla inteligência com simplicidade, meiguice com autenticidade, virtuosismo com personalidade, caráter com humor, doçura com alegria...

Enfim, és tu, única e inigualável, a Ana Carmem que tantos cobiçaram mas que o Senhor, na Sua infinita misericórdia, guardou intocada para mim. Como, tamanho pecador como sou, posso ter sido alvo de tão maravilhosa bênção? O amor de Deus é realmente inescrutável...

Minha vida não foi mais a mesma depois que te conheci. Tu não és apenas minha companheira, auxiliadora de todos os instantes, amante e amiga. És fonte de inspiração e segurança, que me acompanha até quando não estás fisicamente comigo. És presença indissolúvel permeando mente e coração, que me cativa e me domina pelo bem, outorgando-me a dádiva de amá-la com tamanha profundidade que seria capaz de ser feliz apenas em poder contemplá-la pelo resto de minha vida.

Perdoa-me pelos momentos em que, mesmo sob estrita autovigilância, cometo deslizes que te ofendem. Sabes nunca ser essa minha intenção, e que nada é além de um descuidado escape de pressões que tantas vezes fazem a nós, pobres humanos, ainda que com todos os motivos do mundo, atingir justamente aqueles que nos são mais próximos.

Fico tão orgulhoso a cada aniversário, quando te vejo tornando-se mais bela e sábia ano após ano. Quando te parabenizo, não o faço levianamente, como é costume a todos fazê-lo uns aos outros nestas datas festivas. Parabenizo-a vislumbrando em minhas orações por ti o amadurecimento que só traz bênçãos a quem o recebe. O passar dos anos é uma dádiva divina cuja excelência só pode ser percebida por aqueles que amam profundamente ao Senhor e entendem os tempos.

Devemos nos orgulhar por cada ano de nossas vidas, pois na verdade não é algo que perdemos, e sim algo que ganhamos. É mais um degrau acima na escadaria que nos conduz à sabedoria e ao discernimento, o que nos torna servos mais dignos do nosso Deus.

E, em cada aniversário teu, ó amada de minh’alma, estou eu também de parabéns. Estou sempre lembrando que, em tua data, sou eu quem recebe todos os dias, todos os instantes, o melhor presente, que és tu, minha querida.

As bênçãos do Senhor recaiam candidamente sobre ti, de forma duradoura e plena. Sê cheia de tudo o que pode haver de maravilhoso e que nosso Deus pode te dar. E suporta-me ao teu lado, imaginando que sou como um bom cão que, fiel, existe para protegê-la com a própria vida, mas que, nos momentos de descanso, nada é sem ti.

Amo-a mais que tudo. Mais que à fama, mais que a riqueza, mais que à vida. Este amor é o melhor presente que posso te dar.

Hoje e sempre.

Sempre teu,

Ricardo.

(Em 25/09/1998)

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Ensino Tradicional e o “abismo” entre discurso e prática (1)

Ricardo B. Marques (2)
© 1997; 1999; 2006


Fortaleza é uma das cidades brasileiras com maior concentração de escolas particulares. Muitas fizeram nome, seja pelo rigor de um “ensino forte”, seja pela fama de boas preparadoras para o vestibular. E, em muitos casos, tal mérito é justificado. Numa sociedade tradicionalista como a cearense, escolas assim não têm problemas para preencher suas vagas. Na busca de um colégio para os filhos, o que vem logo à cabeça de muitos pais é: “quem é que tem nome e tradição”?, ou “quem é que faz o aluno passar no vestibular?”. De certa forma, valores como esses têm seu lugar e importância numa comunidade.

Mas a Educação tem várias facetas. É um mundo de aparências e incoerências, onde “bom” e “ruim” tornam-se conceitos aparentemente relativos e de difícil definição. Foi sobre esse “perigo” que me pediram para falar, como pretenso educador. Tentarei ilustrar com um exemplo.

Certa vez um casal procurou-me, buscando conselho. O pai estava confuso sobre a situação do filho num tradicional colégio de Fortaleza. Ouvira dizer que ali se praticava um ensino “forte” e “rigoroso” (o que é isso, mesmo?), e decidiu matricular o garoto. Dois anos depois, o rapaz apresentava um desempenho ruim, e professores já haviam-no taxado de “vagabundo”.

Usando de cautela para evitar maior desgaste entre os pais e a escola, sugeri-lhes que procurassem conhecer melhor a proposta pedagógica da mesma: a filosofia educacional do estabelecimento; seus métodos e técnicas; preparo dos professores para lidar com as nuanças dos processos de aprendizagem etc. Era necessário estabelecer se havia problemas no sistema adotado.

Embora nem sempre concordantes, os teóricos da Educação trabalharam bastante na elaboração de diversos recursos para se aplicar em casos em que o aluno pode ser uma vítima do sistema. Ainda que parte desses recursos sejam difíceis de aplicar no sistema das escolas brasileiras, lembrei àqueles pais que também perguntassem aos profissionais do Colégio se já haviam esgotado pelo menos aqueles que lhes estavam ao alcance e dentro da sua realidade possível.

Nos encontramos novamente, dias depois. Os pais haviam procurado a direção da escola, levantando todos aqueles pontos. Curiosamente, ouviram o discurso de que o Colégio – quase centenário –, simpatizava com o “construtivismo”, trabalhava o “raciocínio” dos alunos, as abordagens eram “práticas” e as atividades, “interdisciplinares” (etc.). Os professores, no dizer da escola, eram todos bem preparados; alguns até haviam feito um curso com uma pessoa da Universidade sobre construtivismo. Informados disso (sic), os pais começavam a se perguntar se o menino não seria mesmo “burro”...

Meio surpreso com o novo discurso usado por aquela escola, que até então era famosa por manter-se apegada a um ensino tradicionalíssimo, resolvi visitar aquele estabelecimento na semana seguinte, aproveitando para “matar” a saudade de antigos colegas com quem eu já havia trabalhado em outros Colégios. Logo após o recreio, acompanhei um professor a uma sala de 7ª série, onde ele lecionava Ciências.

A aula foi puramente na base do “quadro e giz”. Um monólogo de 50 minutos, entremeado por alguns rabiscos na lousa. A fala do mestre era só para um grupo de 5 ou 6 alunos que sentara-se próximo dele. Outros 45 se ocupavam com gibis, desenhos, troca de bilhetes, bate-papos “paralelos” e alguns até dormiam. O tema da aula era um assunto palpitante, mas naquelas circunstâncias o resultado era enfadonho, causado por um palavreado rocambolesco, cheio de terminologias a serem memorizadas, distantes do universo concreto do aluno. Bocejei, tentando disfarçar a inconveniência do ato.

Enquanto isso, na sala ao lado, outro professor ministrava uma aula de Matemática , em voz tão alta que pude perceber do que se tratava. Pedi licença e ausentei-me da sala em que estava, dirigindo-me à vizinha. Chegando lá, escorei-me na janela, como quem estava apenas de passagem e resolveu dar uma paradinha. O professor, de costas, não me viu. Discutia com um aluno sobre a prova:

– “Mas professor, a resposta não está correta? Eu usei um caminho alternativo, que é válido...”

– “Não interessa! Você não usou o método que eu ensinei! É zero!” Virou-se e falou para todos:

– “Vamos continuar a aula! Se vocês não aprenderem isso, vão todos ‘se lascar’ no vestibular, daqui uns anos!” E, de costas para a turma, foi escrevendo no quadro, enquanto gritava:

– “O nome deste símbolo é FATOOO...?” – “...RIAAAL!”, completavam os alunos.

Lembrei-me de uma experiência contada por Rodolpho Caniato, numa escola cujas autoridades diziam temer que seu treinamento em ensino de Ciências prejudicasse o “enfoque piagetiano” do estabelecimento, quando, na realidade da sala de aula, não havia enfoque algum. Piagetiano mesmo era o Rodolpho, intencionalmente ou não. A escola não passava de uma formadora de robôs, e temia que a prática daquele treinador de professores revelasse isso.

Para não parecer hipócrita, no mesmo dia expus minha opinião àqueles colegas, obtendo deles razoável aceitação das críticas. Mas saí dali com uma convicção reforçada: o “abismo” entre o discurso e a prática. Não quero afirmar que os profissionais daquela escola não desejassem o construtivismo como modelo pedagógico. É possível até que tenham tido a intenção de adotá-lo. Contudo, numa ótica um pouco mais realista, um simples olhar na sala de aula permitia notar que nada havia de construtivismo, ensino crítico, estímulo ao raciocínio, abordagem prática e interdisciplinar e, principalmente, os professores demonstraram estar despreparados para lidar com uma pedagogia moderna e dinâmica. Afinal, ali, assim como em tantas outras escolas, chega-se ao cúmulo de crianças de 1ª a 4ª série do Ensino Fundamental serem submetidas a provas com perfuração de cartões, a fim de serem “treinadas” desde cedo para o vestibular...

De quem seria a culpa? Das Universidades, que “formam” mal o professor? Do professor, que não faz o que a escola “manda”? Da escola, que adota jargões educacionais, mas não os pratica? Ou do governo, que investe em educação tecnicista e desvaloriza a pesquisa e a cultura? Quem sabe não é do aluno, que pode ter nascido com “bloqueio mental”? No caso do garoto “burro” de quem falamos anteriormente, talvez possa se acusar os pais, por não o terem matriculado desde cedo naquela escola de ensino “forte”...

Nesse nível não interessa a culpa. O problema é que o serviço educacional que se oferece nem sempre é o que se pratica. Não só porque uma pedagogia mais competente é também mais difícil de administrar, mas porque talvez ela não faça parte dos reais princípios que norteiam muitas escolas. Promete-se educação de qualidade, mas o que se faz são treinamentos. Em vez de pensadores, forma-se repetidores. Fala-se de ensino “forte” – o que é isso, mesmo? – , mas apenas produz-se autômatos programados para o vestibular.

Não estou defendendo que professor e escola sejam sempre os culpados de todo mau rendimento de aluno. Mas estou há décadas engajado num projeto de um Colégio sério, ajudando a traçar cuidadosamente sua filosofia; considerando pontos fortes e fracos das teorias educacionais para construir uma proposta sólida; avaliando aspectos práticos de sala de aula; aprendendo a lidar com a (de)formação de alguns professores e treinando-os sistematicamente; investindo na visão da família como elemento básico do trabalho educacional; investigando as influências diversas que afetam a aprendizagem; reconstruindo planos e currículos; elaborando recursos didáticos alternativos; trabalhando com turmas reduzidas; diminuindo ao máximo a margem de lucro; lidando com pais que não entendem a Ciência da Educação; considerando o ato de “pensar bem e criticamente” como a base para o sucesso em quaisquer áreas da vida, inclusive a profissional... Sem falar num ótimo preparo, também (e não apenas), para o vestibular. Mas, em todo esse tempo, ainda não estamos satisfeitos. Talvez estejamos apenas beirando o “rodapé” do ideal. Portanto, não será a adoção de jargões da moda, outdoors ou slogans estampados na entrada da escola que determinará se ela realiza bem, ou não, sua função de EDUCAR, na acepção correta do termo.

Enquanto professores e escolas, apesar do discurso, mantêm-se com uma postura pedagógica inconsistente, os alunos tornam-se meros reprodutores de um mundo de informações cada vez mais difícil de dominar, e sem aplicação à realidade dele e da sociedade em que está inserido. Pior: pais e alunos estão habituando-se a esse merchandising. A tal ponto que começam a acreditar que é esse tipo de “ensino” massificado, reducionista, robotizado, mercantilista, acrítico, “decoreba” como se costuma dizer por aqui, que é o ideal, pois supostamente faz passar no vestibular. O genuíno desenvolvimento da capacidade de pensar, do senso crítico, do raciocínio lógico, das habilidades cognitivas e sensório-motoras, do saber fazer, do pensar melhor, a formação do caráter... estes aspectos parecem poder ficar de lado, desde que sejam citados ao menos como slogans fictícios, no intuito de manter a aparência da escola como pedagogicamente moderna. Na essência, mesmo, o que se faz por aí é perpetuar um ensino tipo “linha de produção”, uma educação “receita de bolo”. Enquanto isso, os aspectos que realmente importam numa Educação comprometida são vistos, até pelos pais, como “secundários”, coisas de ensino “fraco” – aliás, o que é isso, mesmo?

(1) Artigo publicado originalmente no jornal Tribuna do Ceará (1997)
e no site do Projeto Aprendiz
http://www.uol.com.br/aprendiz/forum/colun193.html), fev/1999.

(2) Ricardo B. Marques é biólogo, educador, escritor e conferencista. Paleontólogo, cadastrado no Directory of Palaeontolgists of the World. Zoólogo, cadastrado no World Directory of Primatologists, membro da American Society of Mammalogists , da Sociedade Brasileira de Zoologia e da Sociedade Nordestina de Zoologia. Herpetólogo, registrado no CNAAR Directory of Herpetologists e The Center for North America Herpetology; integra o Directorio Herpetologico Neotropical – Grupo Especialista en Reptiles y Anfibios Sudamericanos. Mestre em Ciência (2004). Formação em Neurociências e Comportamento pela SBNeC (Sociedade Brasileira de Neurociências e Comportamento, ex-SBPb - Sociedade Brasileira de Psicobiologia, 1987), e em Administração Escolar pela Pensacola C. University (Florida, EUA, 1994). Perito em Biologia Forense, membro da International Association of Crime Scene Investigators (IACSI, USA). Analista de Inteligência, membro da Associação Brasileira dos Analistas de Inteligência Competitiva (ABRAIC). Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Gestão do Conhecimento (SBGC/Pólo-CE). Professor de Gestão do Conhecimento e Inteligência Competitiva no curso de Pós-Graduação em Gestão de Negócios, Faculdade Christus. Consultor Técnico do CGECon – Centro de Gestão Estratégica do Conhecimento em Ciência e Tecnologia, Ministério das Relações Exteriores, Governo Federal (http://www.cgecon.mre.gov.br/). Membro da American Society for Biochemistry and Molecular Biology (ASBMB), USA. Um dos fundadores e atual Diretor-Geral do Colégio Kerigma.